quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

Recomeço

In-cansavelmente 
continuo,
é
a única forma que conheço para ser quem eu sou, 
mesmo sem saber se estou sendo;

nunca fui bom com planos
no geral, 
é o acaso que guia meus passos 
e controla meus dias, minhas noites. 
 
Amei com desespero,
ajudei com culpa,
acompanhei com medo,
vivi na Solidão
 
Muito pouco fiz com o pouco que me foi dado
e
também muito pouco faria com muito.
 
Gostaria de não existir quando não existisse mais;
continuar
é correr o risco de que a infinitude de 
minhas angústias sejam encontradas
pelos escafandristas do verdadeiro Chico.
 
Gostaria
de poder sumir completamente 
logo 
após 
o fim do meu tempo; se pudesse, na verdade,
iria
me apagando aos poucos, 
sumindo
sor-ra-tei-ra-men-te das lembranças alheias.
 
Meu orgulho lustroso,
minha vaidade acolhedora,
minha despedida inesperada
e a raiva carinhosa 
 - o melhor de mim é avesso.
 
Observo as ondas que se encontram com as pedras do Arpoador, o tempo parece não passar por ali;
queria ser como o mar e, por vezes, até tento. Mas,
definitivamente,
não
sou capaz de gerar meu próprio horizonte.
 
Estou só e não me sei
e se soubesse creio que já não saberia mais nada.

quinta-feira, 15 de dezembro de 2022

Repentina-mente

 ... de toda sorte paixão
quando não se queriam,
quando 
não se buscavam;

de toda morte vida,
quando
não se percebiam
- mesmo
quando não se beijavam;

até quando o Não.

Foi assim, 
repentina-mente:
como os anos passam,
como se lê um livro bom,
como 
se não houvessem manhãs 
tudo fosse (apenas) presença-infinita;

do espanto riso, 
do medo saciedade,
do instante asa,
do limite moradia;

do aconchego falta
do futuro névoa,
do sonho indiferença,
do não Lar. 

domingo, 2 de outubro de 2022

sexta-feira, 30 de setembro de 2022

Preterido

o gesto inesperado
a vida-seca;

o silêncio imposto
a prisão;

o destino tenso
a despedida-açoite;

a realidade crua 
a solidão do só.

domingo, 21 de agosto de 2022

Jóquei

acordei,
já era tarde,
troquei o almoço pelo fino trato da aurora;

não me desabotoei das lembranças,
quis o filme tolo
e a cerveja estupidamente gelada;

não resisti.
Folheando o livro da Campilho
retornei:

sexta-feira, 5 de agosto de 2022

Um corpo que pesa é um corpo que impõe - II

: e o coração acelera, a respiração falta, o corpo treme

... e Chico repousa suas águas nos pés do outro
e acalma seu corpo com o Frio, com
O-frio
que emana de sua impávida beleza ancestral. 
 
bem depois,
na velha manhã que atravessa a também velha cortina
eles acordam
e no espelho
o
resultado
das ásperas mãos de Chico sobre meu corpo frágil,
do áspero beijo-encontro tolamente permitido
da alma (minha antes-alma) que agora exaspera de paixão
e descontrole;
no espelho
o resultado-idealizado de um momento que é sempre-espera.
 
depois, bem depois dos dias,
já cansado de sentir o peso do teu corpo movimentando-se sobre o meu,
na segunda manhã após o tempo infinito e já sem cortinas
só ele acorda
só ele se veste
só ele se banha
só ele é espelho
só ele
e eu-só.


segunda-feira, 1 de agosto de 2022

Café no fim da tarde

I - Um recital sobre o tempo

Não acredito no verso que permanece.

O verso 
é tintura na mão do acaso,
é 
o termo 
que 
reverbera transformações para longe da mente que o intuiu. De fato, 
não acredito em nenhum tipo de permanência
sempre espero a dúvida que brota depois da última dúvida sanada. 

O tempo passou por mim quando eu voltava da Poesia
e me
disse 
que o texto precisava nascer, mas
que eu não tivesse pressa
que na pressa se morre 
que
é preciso aparar as arestas
e esperar - até quando...


II - Eu só quero o Não

O tempo das coisas ressoa no tempo das próprias coisas
e aprumam-se
em
seu limite de infinitas possibilidades frente as nossas marcas infinitas
e aos infinitos gozos
e as dores que nunca passam 
(em suas noites frias
e também infinitas).

O verso é infenso ao tempo, 
sua composição telúrica
seu devir-memória
é o registro 
do que nunca foi,
do que nunca vai; 
ele 
é o todo desejo
deslocado, 
imparcial, 
respirando entre as suas letras e os espaços.

sexta-feira, 15 de julho de 2022

sábado, 4 de junho de 2022

Um corpo que pesa é um corpo que impõe

Um corpo que pesa é um corpo que impõe

...prefiro 
Sebastião. Reconheço a presença da beleza impávida de Francisco 
esta masculinidade forte, tolamente forte, penso eu, que ainda atrai há tantos. Mas, 
prefiro Sebastião e suas vielas escondidas, seus lugares isolados, sua fala arrastada, suas mãos malandreadas, 
seus dias quentes e também solitários. 

Francisco
é um corpo de santo, mas 
carrega em si
as mazelas da adoração  inócua,
das verdades em gris
e impraticadas; seu corpo
quando pesa sobre o meu, desdenha do meu prazer
e comprime não só as minhas partes – todo meu Ser retesa
em medo
e espanto – sinto-me pudíco entre seus braços.  Sebastião 
é sórdido, tem fama de canalha, mas
não precisa de “mais amor por favor”; Sebastião 
transborda amor – mesmo
sendo a sobra 
das sobras 
das sobras 
depois de 4 tempos do mesmo Estado. 

Francisco, 
por sua vez,
nunca será Chico pra mim, sinto-me preso a este exercício Patriarcal
e soberbo
que ele impõe há séculos (antes 
mesmo 
dos séculos). Não existe Chico de frente ao Chico, teus veios jorram sobre mim
e impõe
o tempo de um império que nunca passou
e que milicía meus sonhos - que desdenha de meus desejos. 
Sinto todo o tempo de não ser Sebastião, sinto
todo o espaço de não ser Sebastião – acostumei-me com sua violência escancarada
e não sei se agüento outro hálito impondo um novo gosto de vida, ou ainda, pior ainda,
outro corpo surrando o meu corpo (desta vez, por dentro,
l-e-n-t-a-m-e-n-t-e, fortemente
como as águas de um rio, de um grande rio)

Francisco é bruto
e Eu 
não consigo mergulhar em tuas águas na busca desta soberana paz
desta soberana beleza
deste reino profundo de calmaria. Sebastião
nunca ocultou suas faces de mim, mostrou-se em ondas,
sem me obrigar a ser outro;
Sebastião me fez e sou todo superfície.

quarta-feira, 25 de maio de 2022

Ainda até não mais

Sou 
o fruto 
ainda verde-maduro da minha exata experiência-inexperiente.
 
Sou 
o passo 
ainda trêmulo-firme da minha indivisível vida-morte.


quarta-feira, 18 de maio de 2022

Escolhas e ansiedade

O tempo d e s a c e l e r a, 
taquicardia, 
desorientação, dores pelo corpo. Respiro, respiro profundamente, não sei onde e nem aonde, não sei nada daquilo que preciso saber. 

Descubro-me corpo, descubro-me mente:

eu
Não
sou.

quinta-feira, 12 de maio de 2022

Eu sou aquilo que escapa dos poemas que escrevo.
Visto-me
de ideias que não tive,
de letras não utilizadas
histórias que não consegui contar.


sábado, 19 de março de 2022

Réquem em Libra II

Todo “até logo” carrega em si um bocado de adeus, nunca se sabe até quando - quando, 
aliás, 
é o limite do tempo repleto de possíveis – seu condicionante 
é o material telúrico da própria vida, encarnação da memória do ontem 
e de infinitos amanhãs. Hoje, 
por sua vez,
é tempo sem registro – hoje é a presença sempre ausente, sempre fugidia, é a respiração que tento e não se completa por falta de ar. Ainda sim fantasio no hoje, 
ainda sim fantasio 
no hoje que sobe a montanha
no hoje que queima de amor 
no hoje que se veste de surpresa. 
Logo,
por outro lado,
tem a duração de dois meses; logo tem o profundo tempo do “soneto do Amor total”, logo é todo tempo que escapa do quando, é o tempo palpável  do infinito... Infinito, 
por outro lado, 
é o tempo sem “logo” e
ou “quando” – infinito é o tempo da espera-pura.

Todo “até logo” carrega 
em si 
uma vergonhosa crise fantasiada de medo do abandono, de despedida,  de medo da solidão que espera por todos nós no limiar do tempo. 
Até logo, até nunca mais.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2022

segunda-feira, 24 de janeiro de 2022

Resposta

As coisas que passam redigem - no tempo e no espaço - o resultado da vida que não vivemos
que não soubemos escolher. A cada esquina virada, a cada café sortido, a cada promessa não cumprida,
apaga-se 
imediatamente
a possibilidade de um caminho que nunca chegou a ser criado. Não,
não
somos apenas o resultado daquilo que foi experenciado, mas também 
uma porção significativa daquilo que escolhemos deixar para trás. Viver não é tecer o próprio caminho, mas
aceitar 
o trajeto construído quando se rejeita as estradas que se abrem a cada passo dado 
e, por isso, 
todo "aprendizado" 
é 
tese acabada de um resultado fortuito
que não poderia ter sido outro
que nunca poderá ser outro
que só poderia ter sido outro se fôssemos outro também.

Não existe beleza nas coisas que nunca foram. 
Nunca é signo vazio, mundanidade pura. Prefiro 
as infinitas possibilidades do tempo que ainda tenho 
ao 
manso regaço dos tempos de outrora e suas lembranças embaçadas. 
Somo infinitos, mas 
apenas quando mantemos o desejo aceso, a chama acesa, o verso que acende
negamos a lembrança que apaga a vontade de Vida. 
 
Aceitar meu passado não me obriga adorá-lo
ou 
esculpir uma beleza que ele não possui.

O amor não é um lago, suas águas não esperam paradas 
e continuaram paradas quando sairmos dele.
O amor é um Oceano, 
interferido pela presença dos amantes 
- até que seus corpos se confundam com sua ausência de limites. 
 
O amor 
é um Oceano
que espera ser desbravado
por erros-certezas-ausências-desculpas-coragem
ou 
medo.

As coisas que passam não me ensinam nada além de passar, mas 
eu não passo.
 
Prefiro não passar. Prefiro 
ter 
exata 
ciência 
do 
passo 
após 
outro 
passo. 

Prefiro ter nas mãos a mudança que quero 
e reconheço a vida como aliada, não juíza. 
 
Prefiro manter-me infinito (até não poder mais).

sábado, 22 de janeiro de 2022

Uma carta sobre a Espera

O sono que chega não me atravessa
e rememorando
d e d i l h o
em 
tons 
de 
distância
voz que sempre esteve. 
Eras tu?
 
O tempo da espera é apenas espera,
espera que nunca chega
sobre teu corpo tenro
sobre tua voz serena
sobre teu abraço quente
sobre tua boca que...
 
Meu desejo esposa outro passado
e hoje
reconheço
a única paz possível. Tanto engano, 
será que ainda me engano?

O tempo da Espera nunca chega, 
nunca ... 

Temi
o corpo rejeitado frente a sua quase-beleza
que nunca é quase
que sempre é tanta
que sempre é transbordo.
Incompleto frases que sempre digo
e
que você sempre quase-não-escuta, 
só olha... 
sempre só você olha,
sempre só você está. 
 
Incompleto corpo, queria outro, exijo outro
– um tanto mais melódico, 
mais feminino, mais 
e
s
g
u
i
o.

Incompleto, 
observo a tessitura dos silêncios que te compuresam em prisão 
e
agora 
destilam Liberdade. 
Silêncio-deus?

Incompleto, 
observo 
o gosto que se manifesta
o corpo-outro que ainda é o mesmo
e o teu jeito sempre correto.

Incompleto, 
permaneço, 
na cama sem toque
nos braços sem carícia
no tempo sem preferência
no amor sem desejo.

O tempo da espera não existe,
o tempo da nossa espera 
nunca existiu. 

Eu não sabia,
você sempre foi sem nunca ser.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2022

Réquiem em Libra

I

Tão pouco... tão pouco de mim ainda resta
e,
sem a maquiagem,
nem me reconheço mais nos vincos que marcam meu rosto. Hoje é um tempo que não passa,
hoje foi o ontem que você não veio... é sempre hoje no texto que declamo
ou na ideia fixa que me acorda. Antes, 
por outro lado, 
nunca é um tempo melhor:
antes é espaço sem vida
antes é projeção 
antes nem é... Lembrar é um movimento que me domina, quase
involuntário, 
discutir em análise é uma saída - se perdoar, talvez - mas nenhum destes caminhos pode ser resposta - resposta prescinde compreensão e, por mais que eu as queira, 
todas ela ficaram com você. Impossível, aliás, seria não ficar com você, com você. Tão pouco
e todo pouco de mim
ainda revivi a trilha que subi agradecido, trilha que 
não aprendi a desbravar e nunca mais achei o caminho. Amor cabe em si mesmo, amar não - sou refém de um substantivo.  

II

Fomos fim antes do começo e planos antes das realizações,
invertemos
e, 
quem sabe, 
talvez a distância tenha sido a única coisa nos sobrou. Eu sempre serei eu, mas 
jamais serei o Eu que fui naquele único dia. Rezar não adianta
também não é preciso - nada é preciso. Nem toda distância é fim de caminho. Andarilho,
projeto-me por cidades que desconheço 
e horizontes que já nem sei mais como colorir - só sigo. Nem toda distância cabe em algumas distâncias, parece
que algumas sempre estiveram 
que algumas sempre estarão
que algumas se espremem entre os corpos que juram "amor à...". Depois
nunca é 
- o beijo perdido resseca com o tempo. Escolhas também ressecam o tempo. Somos jovens até não sermos mais.

III

Bendito seja o que tempo
que nunca chega
que nunca termina
que nunca aprisiona
que nunca deixa claro aquilo que sempre esteve implícito. Amanhã é terço, mas também solidão
e, inconscientemente, alimento a ideia de te ver sobrevoando uma vida que nunca vivemos
um espaço que nunca ocupamos. Longa é a estrada, longa foi a estrada
e
tão mais longa será até... Todos perecem um dia, independentemente das escolhas, 
todos, 
inevitavelmente, 
retornam ao lugar que nunca estiveram. Amanhace na Serra, amanhace no Sertão, 
amanhece
e toda parte de mim procura uma outra parte tua
ainda que só por delicadeza
ainda que só por coragem
ainda que perdida
ainda que a espera da decisão perfeita (no tempo perfeito, na fala perfeita, no mundo perfeito). Zéfiro visitou-me mais uma vez com o teu cheio, era noite
e fez frio - apesar do calor. Agora ontem é tão pouco. Restou tão pouco
que apenas uma noite ficou e 
com ela 
a prova 
que
não é 
preciso 
lutar pelo amor. 


     
 
 

quarta-feira, 5 de janeiro de 2022

Do acaso

O terço-guia, que descreio, que descremos, é o mesmo verso-acaso que se veste (se investe) 
e que contra nós e apesar de nós, em torno nós, 
agiliza 
o nó-encontro
o nó-estrada
o nó-espera
o nó que desenha nas roupas 
e que desenha em teus mundos
e que desenha
o teu olhar-afago e o teu desejo-abraço.

O terço-guia, que descremos, que queremos, é o mesmo
verso-plano 
que se fez vontade, que se faz vontade, que só aumenta 
nos enfrenta, nos aquece, nos espera até o raiar do dia
da conversa boba
do sorriso bobo
dos livros divididos.

O terço-guia, que queremos, que nos é amigo, é o mesmo  verso-tempo, que 
se desdobrou, que se pendulou, 
que venceu o duro concreto da descrença, o duro concreto do não,
que 
agora é todo espera
do beijo-encontro 
da vida-sonho
do repentino amor. 






 

segunda-feira, 3 de janeiro de 2022

Da hospitalidade

                                            "a língua materna já é uma língua do outro"
                                                                   (DERRIDA, p. 79, 20021)*


O corpo,
tão refém das estradas
e tão passeio de solidão,
já não é um corpo - é para além dos espaços,
dos textos
dos beijos
da guerra
- um corpo só o é em relação infinita.

Nenhuma voz. 
De mim 
ressoa apenas as histórias gravadas pelo silêncio.
Eu sou
quem as ouve
quem as vive
como este poema - que não é somente texto, mas
também lembrança e futuro.

Meus passos encontram outros passos,
outros "Outros"
e os acolho para além de mim, sem poder.
 
Minha
estrada jamais foi minha,
ela é do outro
e do outro que também sou para mim.

Se no espelho "não-sou",
então,
como acolher quem é?

Em vão percorro,
em vão descaso,
em vão reflito,
em vão assinto.

Há um tempo para o Outro 
e eu não sei até onde consigo ir...

depois  sem  dispôs, não-tempo;  passos  sem  paço, não-espaços; ví-vida...